O corpo de válvulas foi reformado, que bom! Agora é só colocar ele de volta na transmissão automática eu tudo voltará a ser como quando era zero quilômetro. Utopia? Na maior parte dos casos sim. Preparar uma transmissão automática para receber de volta um corpo de válvulas reformado exige, na quase totalidade dos casos, a reforma da transmissão. Sem esse cuidado, o risco de termos de lidar com resultados desastrosos é bastante considerável.
Entenda:
O câmbio automático conta com um componente muito peculiar chamado corpo de válvulas. O corpo de válvulas é o sistema responsável pela automação que gerencia o funcionamento e dá nome à transmissão automática.
Por uma intrincada rede de dutos que lembra uma placa de circuito impresso, passa óleo altamente pressurizado, que é direcionado para a válvulas, solenoides, entradas e saídas que gerencia a mudanças das marchas dentro da caixa de câmbio.
O corpo de válvulas trabalha sob alta pressão. Com números que variam entre 60 e 200 libras, a qualidade do óleo tem um papel fundamental na garantia de seu funcionamento. O comportamento do óleo sob pressão precisa ser controlado e ele precisa estar em perfeitas condições. O espaço entre as válvulas e as paredes dos dutos é exíguo e qualquer impureza pode provocar danos se ela tentar passar por aqueles espaços. As válvulas em seu interior, são movimentadas pelos solenoides, que ao se moverem, abrem e fecham dutos redirecionando o fluxo do óleo da transmissão para destinos diferentes que irão atuar no comportamento da transmissão.
Veja imagem abaixo:
Os riscos paralelos que aparecem no leito do duto na foto acima são sulcos importantes, verdadeiros vales que permitem que o óleo vaze. Esses vazamentos causam perda de pressão e comportamento errático na transmissão. O duto precisa ser retrabalhado, para que os sulcos sejam eliminados. Mas se isso for feito, a válvula ficará folgada! Sim, é verdade, por isso o passo seguinte é a substituição da válvula por outra de maior diâmetro.
Os problemas
Dentro da transmissão, existem vários componentes de atrito, ou seja, discos e cintas que entram em contato direto uns com os outros a fim de produzir os efeitos de frenagem e liberdade nos conjuntos de movimento. Com o passar do tempo de uso, estes componentes de atrito podem exibir sinais de desgaste. Com o desgaste, algumas impurezas começam a se desprender deles, passando a circular pela transmissão. Invariavelmente, estas impurezas terminam passando pelo corpo de válvulas, podendo facilmente ficar presas entre os componentes. É aqui que começam os problemas. As impurezas alojam-se nas válvulas e atrapalham ou impedem seu funcionamento, além disso, também contribuem para seu desgaste o que implica em vazamentos e alterações de comportamento.
É por isso que a maior parte dos comportamento erráticos da transmissão deriva de falhas no funcionamento do corpo de válvulas.
O reparo
Os possíveis reparos no corpo de válvulas incluem desde simples limpeza, substituição de juntas danificadas, passando por recuperação ou substituição de solenoides e até retrabalhos e substituição de válvulas defeituosas.
Quando isso acontece, os orifícios por onde se movimentam as válvulas danificadas precisam ser alargados através de processos controlados de usinagem que são feitos com ferramentas (brocas ou "rimmer") especialmente projetadas para aquele orifício específico (cada buraco tem sua broca própria). Em seguida as válvulas defeituosas são trocadas por versões alargadas (de maior diâmetro, produzidas pela empresa norte-americana Sonnax).
Dentro dos novos orifícios, as novas válvulas voltam a se mover como devem e os defeitos desaparecem... por um tempo...
A realidade
O que se passa é que somente o reparo do corpo de válvulas não faz milagres. Dificilmente a reforma isolada do corpo será suficiente fazer com que a transmissão volte a funcionar como antes, pois na maior parte das vezes, o corpo de válvulas defeituoso já provocou danos que se estenderam aos componentes internos da transmissão e que só terão solução se a transmissão for reformada em sua totalidade.
Além disso o óleo velho voltará a circular pelo corpo empurrando mais impurezas e novos problemas voltarão a acontecer. As tentativas de apenas substituir o óleo se mostrarão infrutíferas, pois mesmo feito isso, os componente danificados permanecerão assim e o kit de atrito continuará produzindo novas impurezas que seguirão com sua missão de contaminar o óleo. Os problemas permanecerão e quando não, se manifestarão piores que antes.
A inquestionável realidade é que um corpo de válvulas retrabalhado sempre irá voltar a funcionar perfeitamente se a transmissão também for reformada. O oposto é apenas uma aposta.
O sonho
Apesar disso parecer algo simples de ser compreendido, temos recebido corpos de válvulas enviados por outras oficinas para a Automatik para reparos. Fazemos os devidos reparos, bem como os testes de verificações e enviamos os corpos de volta para estas pessoas. Mais tarde nos deparamos com reclamações alegando que os corpos de válvulas "não resolveram" os problemas da transmissão. Procuramos então, nos dedicar a descobrir as causas destes problemas e para nossa surpresa, temos percebido que alguns deles haviam sido colocados de volta em transmissões que sequer foram abertas para reforma. Ou seja, o cliente tinha um sonho: Acreditava que o simples reparo do corpo de válvulas resolveria todos os problemas, voltando a ser tudo como era quando o carro era zero quilômetro.
Infelizmente esse sonho não reflete a realidade, pois como dito acima, as falhas nos corpo de válvulas normalmente provocam danos à transmissão e estes são responsáveis pelos sintomas que o cliente observa.
O que fazer
Para que uma transmissão esteja preparada para receber de volta seu corpo de válvulas reformado, é preciso fazer a reforma completa, ou seja, substituir o kit de atrito, o kit de juntas e o óleo, além de muitas vezes, reformar o conversor de torque e também substituir filtros. Isso, quando componentes de hard parts como bombas, planetárias, garfos, tambores e até engrenagens não sofreram desgaste causado pelo óleo estragado.
Perceba que neste artigo, sequer tocamos no assunto Mecatrônica que é o cérebro eletro-eletrônico que gerencia tudo isso. É um universo à parte que requer um conjunto de procedimentos completamente específicos para ser abordado.
O fato é que óleo de transmissão que dura para a vida toda é um mito que deve ser interpretado como a troca de óleo culmina com a reforma e esta sim, significa vida nova para a transmissão.
Será que custa tão caro mesmo troca o óleo do câmbio automático? Já que ciência é sinônimo de objetividade, vamos começar com uma demonstração matemática simples:
O óleo do câmbio dura no mínimo 50 mil km, já o óleo do motor dura na melhor das hipóteses, 10 mil km. Vamos usar estes números e os respectivos custos para troca para esta verificação simples, na ponta do lápis:
Custo para trocar o óleo do motor: R$400,00 / 10.000km = R$0,04/quilômetro rodado. Custo para troca óleo do câmbio: R$2000,00 / 50.000km = R$0,04 / quilômetro rodado.
Como é fácil constatar, na pior das hipóteses o custo é o mesmo.
Considere então que a troca demanda uma máquina que custa em torno de R$50.000,00, dois funcionários e é feita em cerca de duas a três horas de trabalho, além do litro do óleo chegar a custar cerca de 10 vezes mais, o valor agregado termina sendo uma verdadeira pechincha.Então, antes de que as lágrimas escorram pelas suas faces, encare a matemática de frente como acabamos de demonstrar acima.
Tá, mas por que o óleo de câmbio custa "10 vezes mais caro"?
É uma questão de tecnologia requerida para atender as condições de trabalho. Na prática, o óleo de câmbio automático custa muito mais que o óleo comum de motor porque além de ser importado (não existe produção de óleo de câmbio automático de alto padrão no Brasil), possui uma constituição molecular altamente complexa que exige anos de pesquisa e desenvolvimento tecnológico. Produzir um óleo que seja capaz de reproduzir o efeito "velcro" (como no caso do câmbio CVT) em peças metálicas através da organização do nível químico e molecular de sua fórmula requer um nível único de investimento por parte da indústria. Da mesma forma, suportar os níveis de pressão e temperatura de trabalho dentro de uma transmissão automática também demanda fluidos altamente técnicos. Lembre-se que o câmbio automático é uma máquina hidráulica e o óleo possui uma função ativa, bem mais complexa que o óleo de motor que apenas lubrifica. Outra questão diz respeito à durabilidade, já que o óleo de transmissão automática dura muito mais que qualquer outro, lembrando que os melhores óleos de motor precisam ser trocados a cada 10 mil km no máximo enquanto que 50 a 150 mil km é a expectativa média de vida do fluido ATF.
Numa eventual quebra, um câmbio automático custa muito mais caro que um motor para consertar porque trata-se de um dispositivo muito mais complexo e sensível requerendo mão de obra especializada. O óleo é igualmente diferenciado, então quando tentamos diferenciar câmbio automático de uma retífica, por exemplo (o conserto mais complexo que pode ser feita em um motor), podemos fazer um paralelo entre uma cirurgia ortopédica e uma neurocirurgia cerebral. Tudo aqui é mais delicado, complexo e crítico.
Então, não se assuste, embora o valor pago na hora da troca seja mais alto, ele se dilui nos quilômetros rodados e na sua segurança e de sua família.
Mantenha o óleo da transmissão em perfeitas condições e você garantirá a longevidade de sua transmissão automática.
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